m@ser

6.30.2010

Um filho não é morte que se vença

Nasceste em horizonte desejado
Entre gente de ternura universal
Crescer e ser feliz foi o teu fado
Viver todos os dias com ideal

Que saudades tu sentias de criança
Do amor que te cingiam em bonança
No reverso das paixões, que inconstantes
Baloiçavam entre vagas do levante
Mergulhadas num abismo de rompante
Sem que a morte desse à vida mais descante

Não há raiva ou amargura que liberte
Todo o nosso sofrimento e tristeza
Não há força que nos mate esta plangência
Nem apague o nosso luto e frieza

Nascer, viver, morrer, com pundonor
Eutanásia, só além de tanta dor
Mas um filho não é morte que se vença
Num desgosto que transcende a própria essência
Mergulhada num abismo de rompante
Sem que a morte desse à vida mais descante

PS: Escrito no 3 aniversário da morte do meu filho.
Angra do Heroísmo 8/7/2009
Aristides
Depois de o meu primo definir cruzar a vida por uma mais saída ao mar, passei meses, meses; sempre que ia ao mar, entrando no local onde nós nos habituamos a entrar – O Cais da Figueirinha –, a olhar para o lado mais fora, e, seguir o meu olhar, por entre muitas, até À Pedra, e olhar a arma dele com o arpão enfiado nessa. Durante muito tempo, até um temporal desmontar o cenário, quando ia à minha vida de mar passava por esse paisagem sem nunca ter a coragem de ir lá descortinar o porquê. O medo, daquilo que sei do mar, que lá fosse encontrar um porquê demasiado banal que não justificasse a vida humana. E assim fiz, no dia 16 de Abril de 2009.
Desloquei-me À Pedra. Sim, era uma Abrótia que estava na pedra. Uma pedra dificílima para tirar peixe que fosse quanto mais uma Abrótia. Era preciso colar a arma num arco, a lanterna noutro, e, esperar que o peixe saísse. Comigo o peixe não saiu ao tiro. Eu fui-me embora. Mas estando na cabeça do meu primão, com a certeza dos seus vinte anos, aquela Abrótia era para ser caçada logo, daí o excesso de tempo que ele lá passou à espera, depois de arma, num local, e, lanterna de outro, e esperar e esperar para que ela puse-se a cabeça de fora a tiro.

Assim, fica para mim compreendido o porquê desse excesso de apneia.

Não existe vez que a colocar as barbatanas ou as meias para ir ao mar que não me lembre de ti primão.
Mas agora mais descansado comigo e com o mundo pois fizeste-me perceber da maneira mais brutal que já não tenho vinte anos.

Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem entre os deuses quanto
Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Circunda-te de rosas, ama, bebe
E cala. O mais é nada.

Fernando Pessoa in Poemas Dramáticos